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Uma vez que eu e a minha esposa
estamos a considerar ter um bebé, fizemos algumas investigações sobre o
processo, desta investigação salientou-se o momento do parto como algo
particularmente polémico.
Tal como em tudo, há três maneiras de encarar o parto, de forma
inconsciente (será o que tiver que ser e para a frente que a trás vem
gente), tentando compreender as regras de segurança e cumprindo tudo à
risca (ouvir bem o que diz o Sr. Doutor), ou misturar um pouco de
paixão ao barulho (o amor em primeiro lugar). Normalmente, quando se
mistura paixão ao que quer que seja, surgem muitos pormenores que
estavam escondidos, pois, enquanto no primeiro caso nos pomos nas mãos
do destino, e no segundo nas mãos do médico (ou de quem tiver o
conhecimento), no terceiro caso puxamos a nós as rédeas do destino, e
então temos de ser ao mesmo tempo médicos e pacientes, parturientes e
obstetras. Exige maior consciência, maior envolvimento.
Apesar de haver talvez algumas polémicas em relação ao modo como devem
ser conduzidos a gravidez e o pós-parto (como é o caso da polémica
em redor da perigosidade de algumas vacinas!), de longe a grande
polémica diz respeito ao parto e à preparação para o parto.
A primeira coisa que me chamou a atenção, já há alguns foi a prática da
episiotomia, que sempre me pareceu algo bárbaro. Hoje em dia existe
entre os especialistas um consenso muito alargado sobre o uso excessivo
da episiotomia na generalidade das maternidades.
Exemplos de estudos
Em muitos países a utilização da episiotomia é nula ou quase nula (só
se utiliza quando é realmente necessária), mas no nosso, que eu saiba e
no final de 2006, só o hospital de São João do Porto decidiu não fazer
episiotomia, a não ser quando necessário.
Outra prática igualmente importante diz respeito à separação do bebé da
mãe nos primeiros momentos de vida. Parece que quando o bebé tem a
possibilidade de ser amamentado assim que nasce é muito mais fácil para
a mãe ter leite para amamentar bebé. Quando existe um período de
afastamento (como acontece por norma nos hospitais portugueses, para
limpar e examinar o bebé), aumenta a probabilidade de a mãe ter
problemas de falta de leite que se podem prolongar por pelo menos
várias horas.
Algo que só vim a descobrir recentemente (e que, depois de se saber,
parece extremamente óbvio) é que a melhor posição para o parto não é,
em geral, a habitual nos hospitais (deitada, com as pernas para cima).
Embora a posição de parto ideal varie de mulher para mulher, em geral
uma posição preferível é uma em que a força da gravidade ajude o bebé a
descer. Outras posições (como estar de gatas) também podem permitir um
parto muito mais fácil e rápido do que a posição tradicional. Ou seja,
o ambiente na maternidade deveria ser de forma a que fosse permitido
escolher a posição.
Depois existem todo um conjunto de pormenores, cada um deles não muito
importante, mas que, no conjunto, transformam a experiência do
nascimento em algo traumatizante (em vez de uma experiência, no ideal,
de êxtase e celebração).
Por exemplo para a mãe: o clister e a raspagem dos pelos púbicos, a
constante monitorização da dilatação vaginal, a entrada e saída de
pessoal médico, o facto de a mulher não estar no controlo da situação,
a administração intravenosa de ocitocina, entre outras. Para o bebé: o
cordão é cortado muito rapidamente o que pode levar o bebé a ter uma
sensação de asfixia desnecessária, a aspiração das mucosidades mesmo
quando tal não é necessário, a aplicação de colírio oftalmológico, ou
da vacina K em forma injectável e, claro, o mais importante, a ausência
de contacto físico com a mãe.
Do ponto de vista meramente físico, biológico, todos estes
procedimentos visam assegurar o mínimo risco tanto para a mãe como para
o bebé, mas nós não somos apenas seres biológicos, o vínculo entre a
mãe o bebé começa antes do nascimento, e o momento do nascimento é
importante, para pais e filho, como momento de fortalecimento de laços,
de encontro, de celebração.
Certas mães descrevem o momento do parto, não como algo de dor, mas
como algo de prazer, de realização. Isto é, em grande parte, reflectido
pela libertação da hormona ocitocina, que também está presente quando
se amamenta, ou nas relações de grande proximidade física, como nas
relações sexuais. Se existir um clima de serenidade e confiança é
bastante provável que a futura mamã viva o parte como um momento
extasiante, de encontro, de dar à luz.
Por outro lado, se todos os medos de que algo corra mal vierem ao de
cima no clima esterilizado e controlado do hospital, como se o parto
fosse uma mera operação médica, é natural que a adrenalina ocupe o
lugar cimeiro no corpo da mulher. A adrenalina é tão incompatível com a
ocitocina como o medo é incompatível com o prazer.
É claro, mais uma vez é preciso referir que nem toda a gente estará
interessada neste discurso. Para muitas pessoas o parto é apenas o mal
que tem de se passar para “levar o nosso tesouro para casa”. Não tem
assim tanta importância, numa discussão ouvi alguém escrever: eu até
podia ter tido o meu filho num corredor do hospital! Eu acho bem esta
perspectiva, aliás, parece-me uma excelente abordagem perante as
condições que o nosso país oferece para ter o bebé, e resume-se a isto:
não se deixar afectar pelo aspecto negativo do que possa acontecer no
hospital, em vez disso a fiutura mamã centra-se no aspecto positivo, no
seu bebé e na preservação do seu
bem estar. Sofre-se um bocado, mas o que importa é o resultado, e
depois temos muito tempo, muitas horas, muitos meses, para sarar as
feridas e recuperar ou sanar a confiança, o amor, com o bebé. É uma boa
perspectiva.
A minha perspectiva, no entanto, é esta: vale a pena gastar um pouco
mais de tempo, preparar-se um pouco melhor, e tentar que o momento do
parto não cause mazelas, nem à mãe nem ao filho, que seja um momento de
encontro, esplendoroso, é isto que, por exemplo, estas imagens mostram.
Uma forma de fortalecer as ligações entre pai, mãe e bebé, e não algo
que vai ter de ser cicatrizado mais tarde.
É óbvio que, em Portugal, não é simples encontrar um hospital onde se
possa ter um parto “natural” ou “humanizado”. É óbvio que os riscos de
fazer o parto em casa são substancialmente maiores do que, por exemplo
na Holanda, onde os partos em casa são a norma, mas existe uma
ambulância disponível em caso de problemas. Neste sentido, e nas nossas
condições, pode até ser mais simples optar pelo mal menor, que é
simplesmente não dar muita importância ao momento do parto, encarado
como um momento médico e não um momento familiar, e tentar “compensar”
mais tarde.
No entanto, será bom que todos falemos nisso, pois é assim que as
mentalidades mudam, e talvez dentro de 10 ou 20 anos a episiotomia já
não seja feita em série, a ocitocina artificial já não precise de ser
injectada por sistema, haja condições de privacidade e de mentalidade
para que quem dá à luz se sinta à vontade para ter o bebé ao colo do
marido se for preciso, ou numa piscina cheia de água, e, sobretudo que
não se veja o bebé como algo que tem de ser lavado e analisado assim
que sai da barriga da mãe, mas se dê importância sobretudo ao aspecto
afectivo, à proximidade, não só entre os corpos, mas entre as pessoas,
que vão ser, pelo menos durante uma grande parte da vida, os maiores e
melhores AMIGOS!!
Referências e outros links
Doulas de Portugal:
Um excelente grupo de discussão de onde muitos destes links foram
retirados, informação muito precisa e actual, com uma grande variadade
de pontos de vista e boa disposição! Também têm um blog, links úteis,
sondagens, arquivo de mensagens, arquivo de documentos úteis, entre
outros. Vale a pena ver. Excelente em qualidade e quantidade.
Bebé no Sapo:
Uma perspectiva mais médica do parto, mas muito interessante e com
muitos conteúdos. A primeira vez que se falou de humanização do parto
nesta lista houve "batatada", em todo o caso, acho que se pode aprender
muito a partir dessa discussão, pois de facto, para muitas mulheres,
será preferível sofrer e força. Só para alguns é que vale a pena dar-se
a um grande trabalho (e algum risco) para viver o parto como uma
experiência extasiante. É assim em tudo. O link directo está
aqui.
Fotos:
Eis um site criado por uma mãe que obviamente já pensou muito sobre a gravidez e parto.
Neste link
ela mostra o nascimento do seu segundo bebé em cerca de 100 fotos!! Foi
debaixo de água, numa pequena “piscina” que ela e o pai criaram para o
efeito.
A página principal com outros links e muito mais fotos e informação está
aqui.
É engraçado como, vendo estas fotos, parece tão incrivelmente primitivo
e sinistro (impessoal) o modo como se dá à luz nos hospitais!
Entrevista com :
http://visaoonline.clix.pt/default.asp?CpContentId=34797
Nesta entrevista (em espanhol), Michel Odent, que propagou a ideia do
parto dentro de água, defende que o processo de parto deve ser o mais
calmo possível para o bebé e a mãe. Uma vez que o pai pode viver o
parto com aflição, transmitindo essa aflição para a mãe, Odent sugere
que o pai não participe do momento do parto. E dá como receita
para "um parto rápido e fácil a de uma mulher que dá à luz sem
nada ao redor, a menos que seja uma parteira ou dola com muita
experiência, silênciosa e muito discreta. A imagem ideal é a da
parteira sentada numa esquina
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