contos - poesia - e-mail
parte 1 - parte 2 - parte 3


Sobre a aceitação... (envolvimento)

 

Guilherme — É assim, tudo aquilo de que nós falamos [aqui], não vamos dizer que é certo ou que é errado. É mais que, se nós embarcarmos em certas concepções, em certas visões, e tentarmos realizá-las, com consistência, com os pés na terra, o resultado que vem daí é muito diferente.

Toda a gente sabe que a maneira como abordamos a vida, assim ela será, ou seja, se nós mandamos violência para a vida, retorna a nós a nossa própria violência. Se nós semeamos verdadeiramente harmonia, a vida também nos devolve harmonia. Mas não basta só isso, teoricamente – porque eu posso dizer «agora mando harmonia e vou receber harmonia», mas mandar harmonia tem muito que se lhe diga. E nisto tudo é preciso uma base muito importante que é a aceitação do mundo. Se nós não aceitarmos o mundo, o mundo não nos aceita. Básico.

E a aceitação não tem a ver com concordar ou discordar – com ser passivo. A aceitação obriga-nos a envolvermo-nos muito e a estar muito despertos e muito acordados. Não significa que nós vamos dizer que tudo está certo; pelo contrário, a aceitação leva-nos sempre a ser bastante despertos, a ser cada vez mais activos e cada vez mais participativos, também em termos de acção (fisicamente), mas sobretudo em termos de presença, de consciência, de mente, em relação ao que nos rodeia.

Para haver aceitação tem de haver compreensão, e a compreensão exige o confronto com a nossa própria experiência. Nós partimos de qualquer ponto de partida, do que nos foi dito, mas devemos sempre confrontá-lo com a experiência, com a nossa experiência, e isso é muito mais forte e muito mais valioso do que qualquer doutrina, seja ela de quem for – mesmo da pessoa mais reputada. Por isso a compreensão é muito importante, está na base da aceitação, e para a compreensão podemos partir de qualquer ponto, não há que dizer mal, porque tudo é valioso, tudo tem a sua função, desde o conhecimento mais próximo do senso comum, ao conhecimento mais emotivo, mais poético, ou ao conhecimento mais racional / científico, o conhecimento mais racional / esotérico; seja ele qual for, todos podem ajudar. Agora têm é de ser sempre confrontados com a nossa experiência. E isso vai-nos dar a compreensão.

A compreensão permite muito mais aceitação. Ao partir da aceitação ajuda-nos a compreender melhor. Ou seja, é uma pescadinha de rabo na boca. Se a gente partir do princípio da aceitação há compreensão, com compreensão é mais fácil haver aceitação.

E porque é que falamos na aceitação? Porque a aceitação tem a ver com o início da conversa: é ela que permite a harmonia no mundo, é aquilo que falámos.   Ou seja, se nós aceitarmos o mundo, o mundo também nos aceita, e há uma comunicação com o mundo; e a partir daí é que podemos verdadeiramente ser livres, e falar em harmonia, falar em criatividade, falar em liberdade, falar em amor, falar nessas coisas todas bonitas do mundo. Porque isso é tudo um produto da aceitação / compreensão.

Pronto, basicamente era isso, porque sem isso não há Kung Fu possível. Porque para haver Kung Fu temos de aceitar o que se passa dentro do nosso corpo, e a partir daí é que nós podemos ir mais ao fundo e perceber... porque o corpo, o universo, tudo, tem uma inteligência, e a nossa inteligência tem essa mesma qualidade só que está... adormecida; por isso a única coisa que temos de fazer é expandir essa consciência, é confiar no que nos rodeia; e nessa confiança nós unimo-nos com o que nos rodeia, com o Cosmos, com a realidade – é isso que é a finalidade do yoga: a união.

ir para a segunda parte >>